Compor dentro da “lógica gospel” pode ser um tanto complicado se formos pensar no equilíbrio que o artista tenta buscar entre professar sua fé e viver daquilo que se ama. Como músico experiente e sociólogo, Israel Tenório busca unir esses dois eixos objetivos com suas composições.
Trabalhando num momento de profusão de lançamentos de compositores originários na música gospel, Tenório pula na frente pela experiência com dois mercados e públicos distintos: o estadunidense e o brasileiro.
Sua reflexão sobre ambos os cenários e os caminhos que tomará a seguir podem ser conferidas na entrevista abaixo.
1)- Catedral e Oficina G3 são bandas gospel que quebraram a barreira entre gospel e secular. Sente que hoje em dia há menos resistência na transição?
Essas bandas se destacaram numa época onde fazer música gospel era sinônimo de um estilo limitado; então, eles ampliaram, modernizaram e provaram ser tão boas musicalmente e/ou tecnicamente quanto as bandas “seculares”. É fácil afirmar hoje por exemplo que o Rosa de Saron, Oficina G3 e Catedral estão entre as bandas mais bem sucedidas de pop/rock do Brasil e isso se deu devido a toda uma adaptação do seu conteúdo. Suas letras se tornaram mais bem redigidas ao longo do tempo e com menos chavões “gospel”, o que atraiu todo tipo de ouvinte.
No aspecto cultural, gosto de comparar com os EUA, onde bandas como RED, Switchfoot, Demon Hunter, Stryper e Flyleaf (todas com letras de cunho cristão), fazem turnês extensas ao lado de bandas seculares, e tocam em todo tipo de festival.
A conta aqui é simples: A banda é boa? Organizada? Tem público? Clips? Estrutura? É profissional? Tem boa presença de palco? Todas as coisas que uma boa banda deve ter? Cabe no contexto do evento? Logo, não há restrição alguma em uma país democrático e diverso de ideias, afinal essas bandas que acabei de citar já são bandas que não fazem músicas para serem executadas dentro das igrejas e sim fora delas. No Brasil, as coisas funcionam de modo bem diferente. Eu tendo a concordar em como as coisas são feitas aqui nos EUA. Não acho que as bandas precisem fazer uma transição musical (mas isso é bem pessoal) e sim, essa transição deva ser feita em nossas mentes. Na mente dos organizadores de eventos, produtores musicais e agentes pensantes do mercado fonográfico.
2)- O público dos Estados Unidos difere em quais aspectos do público brasileiro?
Em geral, existe um gosto maior pela musicalidade, e pela expressão musical do artista. É preciso “entregar” um excelente show em qualquer ambiente que seja. Tocar e ser “bom” no que você faz, pode ainda não ser suficiente. Eu percebo aqui um simples bend bem dado no violão ou um simples acorde consegue chamar a atenção de pessoas antes mesmo de começar o show.
3)- Para os próximos trabalhos, quais sonoridades e artistas têm feito sua cabeça para compor?
É difícil definir o que ouço no meu dia a dia. Mas tenho um lado puxado para um rock mais pesado e outra vertente um pouco mais pop.
Uma hora estou ouvindo Dream Theater e depois Snow Patrol, Calvin Harris, Ed Sherran, Neal Morse, Flying Colors, John Mayer, Tiago Iorc, Marcos Almeida e por aí vai. Logo depois estou imerso em playlists de bandas novas. Eu gosto de ouvir as bandas novas e o que as bandas “velhas” fazem de novo. rs
Na hora de compor tento me despir de tudo e ouvir a autenticidade que há dentro de cada um de nós. Um dia sentei na varanda do meu apartamento e escrevi mais de 20 letras. Foi uma necessidade da minha alma, fiquei lá, 3 horas escrevendo sem parar…eu sempre faço as primeiras letras primeiro. E dessa vez dei mais espaço para que elas se manifestem como querem, com menos amarras e mal posso esperar isso tomando forma. Assim que aprendi os 15 acordes básicos do violão já fiz a minha primeira música aos 13 anos, é algo natural para mim.
4)- Podemos contar com um EP ou um álbum inteiro para o primeiro semestre do ano que vem?
Eu acho que minha carreira solo merece um álbum. Posso lançar um single ou dois, antes do álbum. Prefiro uma concepção completa de álbum e também tenho projetos para o Kruyssen em terras gringas. Com certeza, são meus planos para o próximo ano.
5)- Quais as dificuldades como músico você enfrentou no Brasil que não enfrenta nos EUA?
Eu percebi que a profissão de músico aqui é encarada com muita naturalidade e respeito. Já no Brasil ainda vejo esse processo em evolução. Isso torna algumas dificuldades menores, nós não precisamos além da luta normal da vida, lutar com preconceitos pela profissão. Eu não gostaria de bater o martelo, mas acredito que aqui trabalhamos ainda mais, porém é mais recompensador. Acho inclusive que o músico brasileiro é muito mais versátil e isso me ajudou bastante aqui, me preparou para tudo.
6)- Quais diferenças fundamentais para você entre ser um artista solo e tocar numa banda como a Kruyssen ?
Sendo super honesto, tocar numa banda é bem mais desafiador, requer concessões, votos, negação de si mesmo, esperar pelo outro, respeitar, ouvir e entender como uma verdadeira família, porém eu acho mais recompensador na hora que você está no palco.
O artista solo toma conta de como tudo vai ser, mas pode correr o risco de não ter ninguém ao lado para exigir um pouco mais dele, como em um jogo de esporte coletivo. As pessoas podem esperar de um artista solo tudo que ele é, da forma mais honesta possível.